quinta-feira, 17 de janeiro de 2019

CACO

Achar um tecladista pro show de lançamento do meu 1.o CD, "O Culto à Ciência", foi um parto. O cara com quem fechei pulou fora do barco a um mês do evento e eu estava apavorado. Pra quem não sabe, tecladista/pianista para banda de rock/pop não é algo trivial de se conseguir. Tem muita gente aí que faz o serviço de dublê de tecladista mas tocar que é bom....
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Nisso me indicaram o Caco Cren.
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Expliquei a situação pra ele e, durante a conversa, foi caindo a ficha do non-sense da situação: a cada nova informação que ele me dava sobre sua formação e parcerias musicais ficava claro que eu estava tentando contratar um cara que tinha muito mais o que dar do que meu projeto pedia.
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Explicando mais detalhadamente: os sons de teclado do show eram pré-gravados. O batera e o baixista tocaram com um bit nos fones, a banda tocava obedecendo o andamento deles e nos momentos das músicas onde havia sons de sintetizadores, soavam as gravações vindas de um computador. Então, ao Caco cabia somente controlar os volumes desses timbres.
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Ele, obviamente, fez isso com os pés nas costas. Nos momentos em que a banda tocou livre, sem o bit como guia, ele mostrou um pouco daquilo que realmente sabia fazer: ao me acompanhar no "Quem sabe?" de Carlos Gomes e num improviso durante o qual eu apresentava a banda. Ali ele soltou toda sua grande técnica, criatividade e sensibilidade improvisando maravilhosamente bem.
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Fora esse show, houve um outro em que, por um cachê beirando ao simbólico, ele tocou comigo e, de novo, cumpriu seu papel de forma extremamente profissional.
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Receber dos grandes músicos com que toquei algum comentário positivo sobre minhas músicas sempre foi algo que me deu forças pra continuar na luta. Mas vindo dele, tecladista, os elogios às composições em si, aos arranjos, à performance no show, ao clima nos ensaios, etc, bem......, isso me ajudou e ajuda muito ainda hoje.
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Então, vou confessar a vocês que durante este período de dor por essa perda, passou pela minha cabeça que se criar laços de amizade profundos com quem está envolvido em meus projetos continua ser algo primordial pra mim. Essa situação apenas confirmou isso. Mas eu cheguei a pensar que talvez, apenas talvez, quem sabe se nós tivéssemos desenvolvido um contato mais próximo, mais envolvente, de diálogo, desabafos, trocas....quem sabe alguma dor não poderia ter sido compartilhada e o trágico poderia ser, de alguma forma, evitado.
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Mas isso tudo é pensamento no meio da dor. Vi no serviço fúnebre as pessoas com quem ele estava trabalhando recentemente. São músicos espetaculares, claro, mais além disso são pessoas sensíveis e calorosas. Se houvesse algo pra ser visto durante os ensaios e shows que pudessem denunciar o que se passava pela cabeça dele, essas pessoas certamente notariam.
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Mas então, fazer o quê diante dessa coisa horrível que é a dor de alguém que gera um ato tão extremo? Há mais alguns queridos nesse estado ou perto dele? Há algo que eu, nós, possamos fazer?
Será que o máximo que podemos fazer é chorar depois que algo assim acontece?
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Não consigo responder a nada disso e isso me aterroriza.
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Por enquanto, só fico com a lembrança dele se expressando lindamente a cada tecla vivida.
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E peço que os meus amigos músicos, artistas, qualquer um, grite se precisar de ajuda. Outros que também precisam gritar de vez em quando estarão te ouvindo.
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Todas as coisas contribuem para o bem dos que amam. Adeus.
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